domingo, 28 de março de 2010

Carta do Dia: O EREMITA

     Eremita Neste domingo, enquanto fazia minha caminhada tendo o prazer de ver o sol nascer e o céu, qual caleidoscópio trocando de cores rapidamente, aproveitei, como sempre  faço, para meditar sobre o meu momento atual. Gosto de fazer esse tipo de meditação dinâmica, pois creio que a razão conduzindo meus movimentos, minha coordenação motora cuidando para que eu não tropece, não perca o ritmo da caminhada, respire fundo e coordenadamente, acaba liberando o outro hemisfério do meu cérebro para que eu possa mais facilmente permitir que as imagens venham e possam ser contempladas, sem grandes julgamentos, sem me ater muito a elas. Entre muitos e rápidos pensamentos que perpassaram me cérebro durante aquela hora do amanhecer, um deles trouxe consigo algumas respostas para questões que, ainda que eu não as tivesse formalmente formulado, precisava ouvi-las, ou melhor, senti-las neste momento da minha vida. 

     Sempre gostei de “tirar um tempo” para mim. Costumava, desde adolescente, fazer o que na época chamávamos de retiro espiritual. Não pensávamos naquilo como um mergulho em nós mesmos, mas simplesmente um tempo em que passávamos tentando nos silenciar, aparentando uma seriedade e expressões taciturnas que não combinavam com o dinamismo que a nossa idade impunha. Entretanto voltávamos desses retiros mais calmos, menos briguentos, mais atenciosos, e provavelmente um pouco mais espiritualizados.

     Com aquelas imagens brotando da memória, além da saudade daquele tempo e das amizades feitas então, fiquei pensando como isso tornou-se um hábito em minha vida. Algo que faço de maneira quase que automática, sem grandes rituais, tão costumeiro e simples quanto escovar os dentes, fazer a barba, tomar banho, cortar as unhas. Eu diria que, no meu caso, é higiênico, salutar, benéfico e imprescindível. É absolutamente prazeroso, para mim, permitir-me momentos maiores ou menores de isolamento para poder refletir nas minhas questões pessoais. Não necessariamente preciso isolar-me num local deserto, nem parar de trabalhar ou de estar com os amigos. Necessito apenas de algum tempo exclusivo para mim. Isolar-me do ritmo que eu mesmo me imponho, do nível de exposição que eu mesmo me permito, da necessidade de estar sempre produzindo para justificar não sei o que. E talvez seja esse “não sei o que” que eu vá buscar, dentro de mim, ao ficar sozinho comigo mesmo.

     Ouvi uma vez, de um cliente, que ele detestava estar só consigo mesmo. Que precisava sempre de muito movimento ao seu redor e que quando, porventura tivesse que ficar por algum tempo mais isolado, ligava a TV, falava ao telefone até com pessoas para quem nunca pensara em telefonar, tudo para preencher o tempo. Dizia ele que tinha horror a ficar entregue a si próprio. Temia descobrir-se como alguém que ele desconhecesse, que fosse totalmente diferente da imagem que ele havia construído dele para uso pessoal e como máscara para enfrentar o mundo. Lastimável, penso eu, pois ele acabou perdendo grandes oportunidades de remontar seu próprio quebra-cabeça, elucidar-se sobre si mesmo e sobre as questões que pudessem lhe ser importantes.

     O Eremita, Arcano Maior de número IX do tarot, é uma lâmina que simboliza esse intervalo de tempo que dedicamos a nós mesmos, buscando respostas para os nossos mais profundos questionamentos. É o tempo, muitas vezes necessário, que precisamos nos conceder após alguma perda. Uma morte de um ente querido ou o fim de uma grande história de amor merece considerações especiais. Há um tempo de luto, e cobrir-se de luto quer dizer abster-se  da claridade exterior e de seus apelos para encararmos aquele momento como o fim de mais um ciclo natural da vida. Compreender a aceitar. Rememorar lembranças felizes, perdoar erros cometidos e ser agradecido pela oportunidade de ter experimentado essas emoções todas, vivenciado todo o seu ciclo, sepultá-las e seguir em frente.

     Qual é o sentido da vida? Por que determinadas coisas acontecem comigo? Quem sou eu? Quando estamos vivendo o Eremita nos fazemos perguntas que não têm respostas claras, precisas ou pré-determinadas. Nós precisamos de liberdade, de espaço e independência para podermos descobrir nossas próprias respostas e termos a clareza mental necessária para nos aprofundarmos em busca das nossas próprias verdades, sejam elas espirituais, filosóficas ou de âmbito social. Essas são perguntas difíceis, especialmente por se referirem ao significado que os eventos, as casualidades, os golpes de sorte,  as coisas enfim que vivemos no dia a dia e que nos leva a crer que há uma conexão entre o nosso “eu” e aquilo que enfrentamos. Isso pode ser um processo, muitas vezes, doloroso pois somos forçados a admitir que que não podemos transferir a culpa do que nos acontece aos outros, exatamente por haver essa conexão nos ligando intimamente aos eventos. E frequentemente repetimos os mesmos padrões, fazendo com que as mesmas situações voltem a se repetir, possivelmente com pequenas variações.

     O sábio é aquele que possui uma luz própria. As figuras representativas do Eremita, em quase todos os tarots, mostra um ancião (tempo, prudência, paciência), coberto por um manto (introspecção, estado meditativo), apoiado num cajado (experiências anteriores, a maturidade) e portando uma lanterna (a luz da verdade, a luz da ração, a pesquisa em busca do auto-conhecimento), parado num local deserto (sozinho consigo mesmo e liberto das ilusões).  Em nossa vida, ele representa o nosso lado mais secreto e a nossa necessidade de procurarmos em nós mesmos as respostas que muitas vezes buscamos nos outros. É tempo de nos afastarmos um pouco da sociedade ( e isso não significa abandonar tudo e isola-se no alto de uma montanha) e interrogar a nossa alma, procurando saber o que ela precisa e o que já sabe e possui.

     Quando aparece numa jogada de tarot, dependendo da sua posição e das demais cartas à sua volta, além da questão aventada pelo consulente, o Eremita pode significar que é chegado o momento de refletirmos cuidadosamente antes de fazer uma escolha, sem precipitações e medindo as consequências dos nossos atos, inclusive como ele irá se refletir nas demais pessoas envolvidas ou não. É um aviso de que devemos parar ( o Eremita é representado por um velho, portanto é uma das cartas mais “lentas” do tarot), analisar os padrões de comportamento, as emoções e os sentimentos, desculpando-nos, e aos outros, por erros cometidos e aguardar até que a resposta surja, límpida feito um cristal, de dentro de nós. É aguardar para ver como vai ficar. Essa carta é sempre uma sugestão para que reavaliemos o passado para que possamos compreender o presente e prosseguir no futuro. Por ser uma figura de aspeto bem idoso, pode significar a possibilidade de ser ajudado, ou buscar ajuda, com pais, parentes mais velhos, amigos mais idosos, professores, juízes, psicólogos, geriatras, filósofos, conselheiros e mestres espirituais. Recomenda manter uma atitude de prudência, de cautela, de austeridade, humildade e lucidez. Pode ser indicativo da necessidade de se guardar, ou revelar, um segredo, mas isso sempre de maneira muito consciente. Lembra-nos de que é preciso ser paciente, solícito, atencioso e compreensivo para com os outros, auxiliando-os com a nossa experiência e saber.

   09-Major-Hermit   Muitos associam a figura bíblica de Moisés ao Eremita, pois guiou seu povo pelo deserto ( o deserto da vida) para a terra prometida ( o paraíso espiritual). Na Árvore da Vida cabalística o Eremita encontra-se no 20º caminho, ligando Tipharet, que significa “beleza” e representa o equilíbrio, a Chesed, que simboliza a misericórdia, o estado de graça. O Eremita volta, assim, as costas para o que muito do que o mundo tem a oferecer e parte em busca da sua integridade. Conscientizando-se do que busca, é hora de estender a mão ao próximo. É usar de sua luz, de sua lanterna, de seu conhecimento para iluminar o caminho daqueles que ainda estão escalando a montanha.

     A Lua, em sua fase crescente, no signo de Virgem, pode ser traduzida como um bom momento para nos renovarmos através de uma análise mental bem detalhada. Organizar idéias e pensamentos, refletir sobre questões e estar aberto a ouvir a sua voz interior está na pauta do dia. Procure ficar mais reservado, ou pelos menos, tire algumas horas para estar sozinho, seja no seu quarto, seja caminhando pelas ruas ou mesmo passeando por uma praça ou jardim. Reflita calma e tranquilamente sobre os seus sentimentos e só então tome atitudes, desde que ponderadas, razoáveis e sensíveis.

     Aproveitem bem o domingo e tenham todos um ótimo início de semana.

Um comentário:

  1. Adorei o texto..realmente condiz com o momento em que estou vivendo. Obrigada!!

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