A Temperança é aquela carta que quando surge numa leitura de tarot, quase sempre significa que o consulente está sabendo conduzir, e bem, o seu trabalho, os seus relacionamentos afetivos, a maneira com que intervém no ambiente em que vive, a sua vida, enfim. Ela é, junto com a Justiça (Arcano VIII), a Fortaleza (Arcano XI) e a Prudência (Arcano IX), uma das Virtudes Cardinais e pode ser interpretada como o domínio da vontade sobre os instintos, o controle que devemos ter em nossa busca pelos prazeres e a forma equilibrada com que devemos usar e cuidar dos nossos bens (físicos, emocionais, morais, espirituais). Ela é, na prática, o uso da prudência na maneira com que desfrutamos a vida.
Quando, por exemplo, vamos preparar uma refeição, buscamos um equilíbrio entre os pratos a serem servidos. Sabemos que uma dieta balanceada exige um tanto de fibras, outro de proteínas, gorduras, açúcares, vitaminas, etc. Sabemos, até instintivamente, que esses elementos são necessários para o bom funcionamento do nosso organismo e que a falta ou o excesso de qualquer um deles acarreta em problemas. Se exagerarmos nas frituras, além de acumularmos gorduras, termos problemas dermatológicos, entupiremos drasticamente nossas veias. Se usarmos muito sal (sódio), criaremos edemas, teremos problemas de hipertensão arterial. Se não comermos raízes, grãos e vegetais, nosso sistema excretor sofrerá com a falta das fibras e de alguns óleos essenciais. Se nos acumularmos de açúcares, na forma, por exemplo, de deliciosos ovos de Páscoa, o diabetes é uma ameaça, além de termos de comprar roupas um número maior. Portanto, aquela dieta básica de arroz, feijão, carne (ou outra forma de proteína vegetal) e uma salada de folhas, apesar de parecer muito simples e corriqueira, é uma dieta “temperada”, ou seja, equilibrada entre os nutrientes que oferece e as necessidades básicas que temos deles.
Podemos, perfeitamente, nos utilizarmos desse exemplo para outros aspectos da nossa vida diária. Vemos, no rito da missa católica, o momento em que o sacerdote mistura vinho (o sangue de Cristo = os mistérios do êxtase divino) e a água (o símbolo místico da vida espiritual e da renovação). É, no mínimo, uma lição a ser aprendida de que devemos combinar sempre a ígnea chama da sabedoria com a cristalina água da verdade. É o aprender a ter um coração equilibrado.
Com a Temperança, as energias complementares da vida, tais como luz e escuridão, trabalho e descanso, razão e emoção, ativo e passivo, macho e fêmea, se unem. Isso é o elixir, a pedra filosofal produzida pelo alquimista. Carl Jung, em seus estudos, diz que a proposta real dos antigos alquimistas em seus experimentos e tentativas de transformar chumbo em ouro, nada mais é do que o processo de transformarmos nossas fraquezas (metais não nobres) com o uso da pedra filosofal (a sabedoria divina) em ouros (seres iluminados).
O símbolo astrológico para o Arcano XIV, a Temperança, é Sagitário, o arqueiro, meio animal, meio homem. Aqui também vemos representada a união de opostos, das “baixas, instintivas” qualidades humanas, das mais “altas, espiritualmente elevadas”. Polaridade é o que a flecha desse arqueiro pode significar, representando duas tendências dos seres humanos, uma criativa (amor) e a outra destrutiva (morte). Quando usada como arma, a flecha traz destruição, mas como imagem, ela simboliza o vôo do intelecto em busca da verdade. O elemento desse Arcano é o Fogo, numa referência alquímica da necessidade de libertar a alma imortal do corpo mortal através do fogo transformador e purificador. Essa transformação não descreve simplesmente uma idéias, mas uma experiência. A Temperança (Alquimia) nos sugere transformar nossas vidas através das mudanças de comportamento a fim de que possamos liberar a nossa luz interior. O cabalista do Séc. XVI, Isaac Luria, ensinava que essa liberação é uma responsabilidade moral de todo ser humano.
Ao recebermos essa carta numa leitura de tarot, dependendo sempre das demais cartas que se lhe avizinham e da questão proposta pelo consulente, ela pode estar sugerindo cautela. Nos alerta para agirmos cautelosa, cuidadosamente, pensando antes de agir examinando a situação antes de nos comprometermos com ela ou fazermos decisões. A idéia de medida, ou seja, uma ação realizada com bastante precisão, embutida no significado desse Arcano, nos leva a refletir que devemos pensar nas consequências não nos deixarmos levar unicamente pela intuição. Pode estar nos lembrando de que devemos “medir as nossas palavras”, ou seja, sermos moderados com o que dizemos. Evitar extremos, principalmente não oscilar entre os 8 ou 800 da vida. Não deixar que possíveis contrariedades abatam o seu bom humor e entusiasmo, nem exagerar (se extremista) no seu otimismo, pois isso pode acabar redundando no oposto. Pode, também, ser forte indicativo de homo ou bissexualidade.
Muita gente considera a Temperança como uma carta aborrecida, lenta, vagarosa, sem graça, sem nada excitante a respeito e acreditam que para atingir essa virtude é necessário sacrificar os “altos” a fim de evitar-se experimentar os “baixos”. Mas a Temperança é mais do que um simples ato de malabarismo. Ela não nos seda, ao contrário, nos desperta para que tomemos controle das nossas vidas, a agirmos através de escolhas conscientes e não seguindo surtos de otimismo ou desespero. As pessoas acham que a moderação é chata quando elas não querem assumir responsabilidade pelo que lhes acontece, mas preferem que a vida, ou que os outros, os empurrem em seu caminhar.
Mal posicionada, essa carta pode estar nos alertando que estamos sendo extremistas; nos recomenda sermos mais cuidadosos na forma com que nos interagimos com pessoas ou situações. Simboliza o viver-se perigosamente ou então o deixar-se estagnar, não se permitindo fluir. Pode significar que, apesar do nosso discurso edulcorado, da nossa maneira suave de nos expressarmos e procurarmos aconselhar os outros, estamos agindo de maneira anti-ética, com fútil ou falsamente, o que pode levar a complicações e intrigas de todos os tipos e, inclusive, sermos presos em nossa própria armadilha. De maneira mais drástica, pode estar dizendo que a pessoa está instável ou descontrolada.
Se olharmos a carta, do Tarot Namur, que ilustra esta página, encontramos o tema de “combinação” nas duas jarras que o anjo sustenta. Essa imagem traduz a necessidade que temos de combinar, amalgamar, os diferentes elementos da nossa vida. Se nos sentimos divididos entre os dois lados opostos de uma mesma situação, a Temperança nos sugere considerarmos a possibilidade de os unirmos. Se pensarmos em nossa vida como em partes separadas, como, por exemplo, a maneira com que nos comportamos no trabalho sendo diferente da nossa forma de agir em casa, ela sugere que combinemos esses diferentes aspectos.
Estamos no final da Quaresma, tempo de reflexão e de busca de significado e reequilíbrio entre as nossas vidas neste plano físico e a nossa evolução espiritual. Vênus, o planeta regente desta Sexta-Feira da Paixão, tem como glifo (símbolo) o círculo (espírito) sobre a cruz (matéria) o que significa união, ligação, harmonização. Portanto, a energia amorosa desse planeta muito bem representa os aspectos constantes e serenos da Temperança. A Lua, em sua fase cheia, deixa Escorpião e entra em Sagitário ainda hoje, o que nos influencia proporcionando-nos um estado de espírito mais positivo e otimista. Sentiremos vontade de nos “agregarmos” a pessoas que possivelmente sejam bastante diferentes de nós, mas estaremos dispostos a somarmos essas diferenças e as combinarmos com as nossas, aprendendo com os erros e os acertos, o que também é típico do processo alquímico transformador proposto pela Temperança, nossa carta do dia.
Hoje muitos estarão assistindo às re-encenações do martírio e morte de Jesus. Filmes com esse tema estarão sendo exibidos pelas emissoras de TV. A quem se interessar, há um momento, quando o centurião Longinus, o primeiro a declarar a morte de Cristo, é respingado pelo sangue e pela água que jorram do ferimento feito à lança em seu peito. Essa imagem entrou para a iconografia clássica da Igreja como a da Misericórdia Divina”, onde um pálido raio luminoso representa a Água, que faz as almas agirem corretamente, e o raio vermelho, o Sangue, que é a vida dessas mesmas almas. Faustina Helena Kowalska, santa da Igreja, em suas visões, explicava essa união entre o sangue e a água derramados na cruz como um escudo protetor, dizendo: “Felizes aqueles que vivem ao seu abrigo pois a mão direita de Deus não os abandonará”. Mais uma vez, a ação combinatória da Temperança.
Tenham todos um excelente e harmonioso feriado, encontrem a sua paz e não se deixem dominar pelas emoções, e aproveitem com segurança o final de semana!
Obrigado.
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