Ontem à noite parei na esquina para comer uma tapioca. Desses impulsos que a gente tem e que nos faz esquecer da dieta, das calorias, de quantas pedaladas mais vamos ter que dar para queimá-las, etc.
A adolescente que as prepara está nesse local há mais de um ano. Só compro dela, por diversas razões: seu carrinho é limpíssimo, seu material de trabalho, impecável, e ela, além de ser uma simpatia, trabalha paramentada como se estivesse numa cozinha industrial. Muito bacana.
Às vezes conversamos um pouco, quando há menos gente esperando pela vez. Ontem foi uma dessas oportunidades. Perguntei-lhe se sabia que era o Dia Internacional da Mulher. Disse-me que sim, que a professora havia pedido uma redação a respeito. Perguntei-lhe o que estudava e ela me disse que estava terminando o 2ºgrau e que pretende fazer veterinária, pois sempre gostou muito de animais.
Enquanto preparava meu pedido, disse-me que ia à escola pela manhã, depois de ajudar a mãe a arrumar a casa e dar o café da manhã para os outros filhos. Voltava a tempo de preparar o almoço para os irmãos, lavava a roupa da casa, fazia dos deveres da escola e, às seis da tarde, descia da comunidade onde mora para a avenida, onde já tinha uma clientela fiel. Prepara suas tapiocas até as nove da noite, “quando o pessoal já não vem mais pra rua, com medo”. Volta com seu carrinho para casa, conta o dinheiro, dá uma parte para a mãe usar em casa e a outra, guarda para quando for fazer a faculdade. Dorme feliz.
Voltei, para casa pensando nessa jovem mulher, trabalhadora, atenta às oportunidades que a vida possa vir a lhe oferecer, consciente da sua importância na ajuda real da manutenção do lar, disposta a enfrentar o cansaço, a abandonar grande parte das diversões próprias da sua idade, trabalhando, tão jovem, por um sonho. Ainda que ela não saiba, é o exemplo mais próximo que eu tenho de um Pajem de Ouros, que pode ser definido como um estudante, um aprendiz, um jovem empregado, um neófito entusiasmado.
Pessoas como essa vendedora ambulante costumam ser atenciosas e atentas, realistas, seguras, fascinadas com o mundo, curiosas, muito trabalhadoras e focadas em seus objetivos. São iguais a São Tomé, precisando tocar e ver para acreditar. Detalhistas, examinam todos os lados da questão, sempre mantendo os pés firmemente plantados no chão. Amam a Natureza e, por conseguinte, todos os seus filhos. Animais inclusive.
Quando um Pajem de Ouros aparece numa tiragem de tarot, dependendo do lugar que ocupa e das cartas que o acompanham, além da pergunta do consulente, pode sugerir que se deve ter uma atitude consciente e responsável; que se deve planejar cuidadosamente e seguir o passo-a-passo das instruções que recebemos; um tempo de se apreciar o que se tem, inclusive o próprio corpo, dispensando-lhe cuidados e carinhos; assumir riscos para alcançar um propósito realista; começar um novo projeto; voltar a estudar. O Pajem de Ouros também pode representar alguém próximo, tal como um trabalhador esforçado, um amigo organizado, alguém que nos ajuda, direta ou indiretamente a transformar nossa visão, nossos projetos em realidade.
É claro, que como todas as demais cartas do tarot, essa também tem um aspecto negativo, o chamado lado “sombra” que pode ser constatado quando existe uma dificuldade de aprendizagem; falta de interesse em aprender ou estudar algo; indolência; exaustão; jogatina; trapaças; desperdício; desrespeito à Natureza; rebeldia; tirar partido para obter vantagens; teimosia que acaba obscurecendo uma análise realista e justa dos fatos; abusar da boa-fé das outras pessoas. E muito mais.
Algumas pessoas costumam interpretá-lo como um mensageiro, especialmente de assuntos referentes a dinheiro ou a negócios. Eu penso que a jovem fazedora de saborosas tapiocas recheadas é um Mercúrio disfarçado. Sua mensagem, envolta pela sua jovialidade, sua vivacidade, sua tenacidade, seu charme pueril, é a de que o conhecimento associado ao trabalho e direcionado a uma meta determinada é a fórmula mágica de concretizarmos nossos objetivos. Esse é o segredo. Não aquele que enriquece o bolso de autores e editores que se propõe à linha de auto-ajuda. Mas a vivência diária, em cada esquina da cidade, de pessoas anônimas que sabem, instintivamente, qual é o “abracadabra” da materialização dos seus sonhos.
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