Todas as vezes que numa tiragem de tarot eu me deparo com o Cavaleiro de Espadas não posso evitar em associá-lo à figura daquele aparentemente frágil ser humano que em Pequim, no dia 5 de junho de 1989, em meio aos maiores confrontos e massacres na Praça da Paz Celestial (bom nome para um campo de guerra, não é mesmo?) enfrentou desarmado de qualquer coisa a não ser a profunda crença em um ideal , e fez parar, um comboio de tanques de guerra. Seus motivos? Uma questão de ideologia. Sua personalidade? A de um combativo defensor de suas verdades pessoais. Seu caráter? A de defensor dos fracos, corrigindo as injustiças que oprimem e que possam obstruir a causa que ele acredita e lidera.
Cá estamos, iniciando Fevereiro, com um calor que só pode mesmo agradar aos donos das fábricas de ar-condicionado, com muito sol, ainda imersos numa semi-indolência que mistura o tríduo verão-férias-carnaval e, logo no primeiro dia do mês, ei-lo que surge: o nosso bravo, indômito, corajoso, hábil, esperto, ligeiro, analítico, argumentativo, intempestivo Cavaleiro de Espadas, protegido por sua brilhante armadura, singrando os ares em seu corcel branco, provocando ventanias e furacões em sua passagem. Não seria para menos, pois o elemento deste arcano menor é o Ar (Espadas = Ar =Mental) e, como todos os Cavaleiros do Tarot, ele é a forma mais exaltada do elemento que representa. Numa escala entre sopro, brisa, vento e ventania, ele fica mesmo é com os tornados e os furacões, incontrolável e arrasador em sua passagem.
Todos nós, se não o somos, temos parentes, amigos, conhecidos, ou mesmo cruzamos diariamente com pessoas que são fiéis representantes de muito do que essa carta simboliza. São sempre pessoas muito analíticas, fiéis às suas crenças, ideais, filosofias e princípios, frias e calculistas em sua forma de pensar, mas de temperamento esquentado, que falam o que pensam e, por isso mesmo podem ser consideradas, por vezes, imprudentes. São excelentes estrategistas, planejando a longo prazo, habilidosos na forma de conduzirem seus interesses e defenderem suas causas. Ótimos amigos, sempre ao nosso lado evitando que soframos qualquer forma de coação e procurando resolver todos os nossos problemas. Mas como inimigos, são inigualáveis: furiosos, julgadores, dominadores, maquiavélicos, verdadeiros guerreiros prontos para derrotar a quem ou ao que se interpor entre eles e suas vontades.
Em situações bastante cotidianas os encontramos entre os executivos, os administradores, os gerentes, os que trabalham no mercado de ações, os analistas econômicos, advogados, promotores, juízes, delegados, detetives, policiais, soldados, técnicos em computação e até mesmo nos editores, ombudsman e críticos de determinadas seções dos jornais e revistas, bem como nos professores de ciências ou matemática. Enfim, em todas as profissões quando a clareza mental, a capacidade de analisar seguindo regras específicas, baseando-se em padrões básicos onde tudo deve ser “o preto no branco”, intelectualmente capaz de identificar o mal e condicionar-se em destruí-lo, se faz necessário.
Evidente podemos, aqui, também mencionar aspectos menos louváveis de tão intrépido Cavaleiro: o fanatismo, a hiper-atividade, o fato de, sendo cerebral demais, perder contato com a realidade e, especialmente com as suas emoções. Em seu descontrole, pode tornar-se um carrasco, distribuindo sentenças mortais a torto e a direito, um revolucionário sem causa, crente numa utopia barata do tipo: “ Se hay gobierno, soy contra!”, na verdade comprometido com nada e completamente errático.
O imaginário popular cultua, especialmente nas religiões afro-brasileiras e na cidade do Rio de Janeiro a figura heróica de São Jorge, um cavaleiro que, de acordo com a “Lenda Dourada”, em sua busca de corrigir injustiças e defender os fracos, acabou matando um dragão que aterrorizava uma província da Líbia. Como prêmio ganhou uma grande recompensa e a mão da princesa em casamento e, por conseguinte, metade do reino. São Jorge, fiel aos seus princípios, deu todo o dinheiro ganho para os pobres e nada mais aceitou, seguindo seu caminho em busca de novos embates com o Mal, o qual ele identifica e destrói.
Dentro da minha maneira de perceber toda essa simbologia e o fato dela ter surgido hoje, num dia 1º, uma segunda-feira (primeiro dia útil), penso que seja para avaliarmos se a enorme energia que, muitas vezes, despendemos em algo que naquele momento nos parece fundamental, imprescindível e digno de todo o nosso empenho, custe o que custar, realmente vale a pena. Se está bem equacionado, analisado em cada uma de suas partes, avaliadas suas consequências e métodos (não vamos “atropelar” nada ou ninguém para conseguirmos o que queremos, não é mesmo?) que pretendemos empregar. Se não estamos encarando os fatos apenas de maneira racional, calculista, abrindo mão da emoção, da intuição. Se estamos sendo pacientes, prestando atenção a tudo o que se desenrola à nossa volta, ainda que mantendo o foco em nosso objetivo, conscientes do perigo que é ignorar ou desprezar quem nos cerca.
E, se depois de todos os aspectos terem sido perfeitamente considerados e julgados, se decidirmos por seguir adiante, com força e destemor, mantendo-nos firmes no que acreditamos, pois a verdadeira coragem não é a força brutal dos heróis vulgares, mas a firme opção que fazemos pela virtude e razão.
Bom dia e ótimo início de semana a todos!
Do ponto de vista alquímico, o maior erro de São Jorge foi ter morto o dragão.
ResponderExcluirNão há evolução sem matéria!
Não há Bem sem o Mal, porque como alguém disse (não me ocorre o nome):
"O Mal é o trono do Bem!"