quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Carta do Dia: O JULGAMENTO

   20-Major-Judgement6       A Carta do Dia hoje tem muito a ver com algo que eu próprio deverei fazer nas próximas horas. Faleceu uma grande amiga e haverá uma cerimônia antes do seu corpo ser incinerado, nesta tarde. Lá estarei, junto à família e aos demais amigos, consolando-nos pela sua ausência, rememorando seu caráter e esfuziante personalidade, possivelmente rindo e chorando ao mesmo tempo e encerrando uma etapa de nossas vidas. Vivendo, a partir de agora, a sua ausência não como uma lacuna, um tenebroso vazio, mas transmutando sua memória em algo eminentemente nosso e que nos acompanhará como uma motivação para enfrentarmos os percalços que a vida possa nos apresentar, e nos deliciarmos com as benesses que dela, a vida, também recebemos em igual proporção. Sabemos, em nossas almas, que ela evolui para um plano superior a este, reconciliada consigo mesma, redimida perante sua consciência, totalmente desperta em sua espiritualidade e pronta para iniciar um novo ciclo cósmico.

     É claro que o Julgamento tem ainda um ranço muito grande, cristão (e por favor não vejam em minhas palavras nenhuma crítica a nenhum sistema religioso) de que chegará um dia em que todos os vivos e os mortos, que ressurgirão de suas tumbas, ouvindo o chamado do Anjo do Senhor (Gabriel) para serem julgados e então começar uma nova era de amor e paz celestial, livres de pecados e separados, os bons dos maus.

     Penso que esse tribunal onde todos prestamos contas dos nossos atos existe dentro de nós mesmos (consciência) e que temos não uma, mais inúmeras possibilidades de “renascermos” para uma nova vida.

     Mas não posso deixar de aproveitar esse momento de saudade da minha amiga para refletir sobre o nosso tempo nesta terra, e de quantas vezes “morremos” e renascemos, para novas, maiores, mais intrigantes, produtivas e mais harmoniosas oportunidades. Todos os dias temos, de alguma forma, uma chance para melhorarmos. Para abandonarmos um passado que já não mais nos interessa, que nada mais representa na ordem das coisas e, libertos, apreciarmos, com surpresa, admiração, às vezes medo ou ansiedade, mas de coração aberto, o que a vida tem a nos oferecer. Somos verdadeiras fênix que , ao sentirem sua missão cumprida, o tempo que tinham para uma determinada missão esgotado, constroem seus próprios ninhos e neles se imolam no fogo regenerador do espírito (isso sempre me lembra a simbologia de Pentecostes) e renascem ainda mais belas e fortes, preparadas para novas missões, novos embates.

     Nem sempre aquilo que planejamos ou sonhamos para nós é exatamente o que alcançamos. Muitas vezes nos surpreendemos com as guinadas do destino, as mudanças absolutamente inesperadas que a vida nos propõe, mas as aceitamos sem dor, sem ressentimento, como uma novidade, algo que nunca havíamos pensado fosse nos acontecer e que acaba se provando muito mais interessante, útil e potencializador do que aquilo que queríamos ou esperávamos. É uma nova chance de começar, seja através de um novo trabalho que surge do nada, uma mudança para uma nova casa, numa nova cidade onde viveremos melhores condições de vida, um novo relacionamento muito mais completo do que os que já vivemos anteriormente.

     Quando eu era criança e ficava frustrado com o resultado das coisas que não saíam como eu esperava, minha mãe sempre vinha com aquele ditado:”Deus escreve certo por linhas tortas”, e eu, na minha total falta de experiência respondia, emburrado, que então ele deveria comprar um caderno melhor. A vida me ensinou, paulatinamente, através de longos anos, que tudo o que nos acontece, ou deixa de acontecer, obedece a um padrão muito maior, que nos leva a outros patamares, nos oferece outras possibilidades, até mesmo as de revermos nossos conceitos, nossos desejos, nossas metas. É uma chance de olharmos à nossa volta e vermos o que nos cerca com outros olhos (lembram-se do Enforcado, o arcano que foi a carta de ontem?), sob uma perspectiva diferente, mas certamente muito mais iluminada.

     O Julgamento não é simplesmente virar as costas para o passado ou abandonar uma idéia sem dela fazer nenhum juízo de avaliação. Ao contrário. É uma soma de vivências, de reconhecimento de nossos erros e acertos, da honesta avaliação de nossas escolhas durante a nossa jornada, de colheita dos frutos daquilo que através do nosso livre-arbítrio semeamos pelo caminho, da nossa coragem de enfrentar nossos próprios demônios e temores. O passado não é para ser escondido ou esquecido, mas encarado às claras, uma vez mais, confrontando-o e julgando-o antes de ser ultrapassado. É esse exame de consciência que dá um encerramento a um ciclo e nos permite um renascimento, livres de culpas, angústias, redimidos conosco e com o universo, prontos para aceitarmos o chamado interior para fazermos uma nova e importante mudança de vida, renascendo para um novo mundo a fim de cumprirmos um novo propósito.

     Na cerimônia que faremos na tarde de hoje estaremos, ritualisticamente, encerrando um ciclo em nossas vidas. Nossa amiga não estará mais, fisicamente presente, para nos entreter com suas histórias, nos divertir com o seu jeito muito autêntico de ser, representar a âncora da qual podíamos nos valer numa miríade de situações. Deixa-nos entre as mais agradáveis memórias, a sua corajosa luta contra a doença. A sua maneira de viver anos de de sofrimento físico transmutando-os num desapego das coisas materiais e se reabilitando com sua consciência, com a sua espiritualidade, com a fé em algo maior que nunca a abandonou. Creio que Bibi (Sybil May Halter) sempre soube onde esteve, onde estava, e para onde iria, consciente de suas fraquezas e de sua força, nunca temerosa de ouvir o chamado interior, mesmo mergulhada no burburinho da vida diária ou nas longas e solitárias permanências hospitalares.

     Estou certo que neste momento, em algum lugar que a minha irrisória idéia de tempo e espaço não me permite avaliar, ela regenera-se  unida ao seu Criador, recuperando suas forças, construindo o seu ninho para um dia, uma vez mais, trazer a este plano o brilho da sua alegria e uma nova lição de vida.

     Permitam-se, neste dia, reconciliarem-se consigo mesmos e viverem, com muita alegria, as mudanças (sejam quais forem) que a Vida lhes propõe.

Ilustração: FULL MOON DREAMS TAROT

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